quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

A VIAGEM



Fecho os olhos. Respiro fundo.
Demorei cinco tempos até chegar ao outro lado.
De vestido de algodão branco até aos tornozelos caminho descalça em direcção ao paraíso.
Os céus pressentem a minha chegada.
Ao fundo ouço os timbres dos trovões secos que caminham na minha direcção trazendo consigo o licor dos deuses em forma de água.
Sob os meus pés nus e frios, delicadamente, por entre as frestas do grande carvalho que me acolhe, caiem gotas de chuva. Uma a uma, uma a uma, uma a uma.
Enquanto caminho deleito-me com o seu toque. Parecem pequenos anjos a massajarem os meus pés.
A brisa do vento, envergonhada, subtilmente beija o meu rosto, escondendo-se rapidamente por entre os galhos do grande carvalho.
Folhas de várias cores, amarelas, verdes, vermelhas e castanhas, soltas pelo vento, caem aos meus pés.
Olho em frente e observo o tapete fofo e ainda quente que desenham no chão. Confortavelmente caminho sobre ele, produzindo um manto de plumas brancas que lentamente sobem aos céus.
Ao fundo avisto um rio de água cristalina que sustenta uma pequena ponte de madeira.
A meio da ponte encontra-se situado o meu Mestre, que sorri docemente enquanto observa a força do caudal do rio.
Dirijo-me até ele.
Faço-lhe uma vénia como cumprimento e respeito.
Ele retribui-me com um sorriso.
Durante minutos olha-me nos olhos. Percorre toda a minha alma e pensamento.
Permaneço imóvel.
Toda a sua bondade, amor, tranquilidade, serenidade e paz consagra o meu ser.
Sinto-me abençoada.
Faz-me sinal para estender a mão. Coloca-me um pequeno tronco de árvore e pede-me que atire rio fora.
Esse pequeno tronco representa todo o passado que não interessa mais.
Tal como o tronco, que já não pode regressar à árvore onde nasceu, os acontecimentos do passado já não podem voltar à minha vida.
Observo-o a avançar rio fora, por entre a corrente, mergulhando e vindo ao de cima várias vezes, até que desaparece do alcance da minha visão.
Ao fundo vejo a sobrevoar uma Fénix com um pequeno tronco na boca, que acabara de colher no rio.
Voa em direcção ao seu ninho e coloca-o bem no topo. Pousa e aconchega-se junto dele.
Em silêncio contemplo a beleza dionisíaca que me defronta, conseguindo alcançar a mensagem que me está a ser passada.
Aquele pequeno tronco perdeu a importância que tinha como tronco que, em tempos, acolheu flores, folhas e frutos. Agora a sua função é outra. Deverá acolher e proteger uma das mais belas e simbólicas aves que simboliza o renascimento.
O passado de vida não interessa mais procurar. Servirá para alguém como obra de crescimento e de referência.
A minha vida presente encontrava-se à minha frente. Pura e cristalina como a água daquele rio.
Faço uma nova vénia de agradecimento ao meu Mestre por ensinamento tão sábio.
Numa voz solene que entoa os céus diz-me: - O conhecimento vive dentro de ti e está sempre ao teu alcance. Basta chamares por ele que o encontrarás.
Olho para cima e contemplo um feche luminoso que desce lentamente até junto de nós, formando à minha frente um espelho de luz. O meu Mestre faz-me sinal para avançar.
Despeço-me dele agradecendo uma vez mais e avanço.
Dentro do feche luminoso, 3 objectos são-me passados para a mão por um Ser de Luz.
Um escopro, um martelo e uma pedra.
A mensagem era tão clara quanto a luz que irradiava toda a minha entidade.
Do outro lado da luz encontra-se uma senhora em pleno trabalho de parto.
Dentro de poucos minutos uma nova vida iria nascer.
O Ser de luz diz-me:
- Segue. O próximo passo terá de ser dado por ti.
De livre arbítrio, estou prestes a esculpir a minha nova vida.
Inspiro profundamente com um enorme sopro de vida, de amor, pureza, prazer e felicidade.
Penso - em cinco tempos estarei do outro lado.
Serei um rapaz e chamar-me-ei
Mateus.

4 comentários:

Anónimo disse...

Hoje tive um dia péssimo!
mas realmente o unico momento que me transmitiu calma, foi ler este post.....
obrigada ana
e aproveito para felicitar que cada dia a tua veia para a escrita vai se tornando mis interessante e única!

Bairrista disse...

Não comento mais vezes por aqui porque nem sempre sei o que hei de dizer.

Gosto do que escreves, de como transmites a tua forma de vida, da serenidade que transmites com os teus pensamentos, da tua forma de encarar a esfera que é a vida.
Gosto de ti una, do teu espirito e mente que me fascinam e que pouco-a-pouco me atrairam para novas visões.

Adorei este teu post.

Beijo grande e nunca pares de crescer.

Anónimo disse...

hoje a melancolia abraçou-me...
um enorme sopro de dúvidas,acercam-me ...
um beijo para ti !

Anónimo disse...

uma representação bela e serena da Morte... hà quem tenha uma visao assustadora! Agrada-me e tranquiliza-me esta ideia, esta caminhada ao Paraíso!
um beijo amigo para ti!